terça-feira, 4 de dezembro de 2012

"DÔ"

                                                                       foto: João Meirelles

Vim para Salvador assistir a estréia do novo espetáculo do Bando de Teatro Olodum. Trata-se de DÔ, uma criação dirigida pelo célebre dançarino de Butô Tadashi Endo. A montagem, feita em tempo recorde, reflete a força desse encontro inusitado e feliz:  a energia e carisma dos atores negros do  Bando e a melancolia e profundidade do universo  do Butô. "Dô" é uma palavra japonesa que significa "movimento", mas o título, no Brasil, e mais especificamente na Bahia, ganhou outros significados: “dô” de “dor”, “dô” de “dou.” 

Quando vi a  peça pela primeira vez fiquei imersa em  suas imagens, o universo ora terrestre, ora lunar, construído por Tadashi, a beleza dos corpos dos atores. Só depois o espetáculo foi ganhando para mim ares mais narrativos. Uma história de exilados, retirantes, refugiados, que, através da força e de sua história pessoal, tentam impor sua individualidade no ambiente hostil que passam a ocupar.

As metáforas da catástrofe, tão comuns ao Butô, tem aqui, apesar de tudo, cores vivas e formas alegres. O espaço arrasado é uma pscina de bolas onde, pouco a pouco, os indivíduos redescobrem o prazer e, através de uma nova pele, reencontram uma forma de harmonia coletiva. Passado o estupor da trégua, a realidade recai sobre os corpos que se esforçam para se reconstruír. Pouco a pouco, os movimentos se tornam mais fluídos e humanos e, apesar das sequelas, as pessoas ali reunidas acabam por se reconciliar com o espaço urbano através de uma apropriarção da cidade por via de seus corpos e do espaço que eles ocupam: tanto físico quanto simbólico. 

Por beber do Butô a peça, impreterivelmente, nos faz pensar na segunda guerra mundial e na bomba atônica, mas nos remete, mais recentemente, ao terremoto, ao tsumani e a catástrofe nuclear que abalou o Japão em 2011. Simultaneamente é capaz de nos trazer à realidade das cidades brasileiras e seu frágil equilíbrio social. Belo.

O Bando de Teatro Olodum conta com 20 anos de atuação e faz parte da história do teatro baiano. A companhia, residente do Teatro Vila Velha, é formada por atores exclusivamente negros, é uma das poucas a manter um corpo estável, com elenco, diretores e técnicos. Em sua trajetória, o Bando construiu e consolidou uma dramaturgia e estética próprias, tendo o negro e sua tradição sociocultural como matéria-prima de seus espetáculos.

Tadashi Endo é diretor do Mamu Butoh Center e do Mamu Butoh-Festivais em Göttingen (Alemanha). É, atualmente, o principal divugador de Butô no Ocidente. Foi discípulo do mestre Kazuo Ohno. O butô é uma forma de dança-teatro que surgiu no Japão pós-guerra. Criada por Tatsumi Hijikata e Kasuo Ohno, que ganhou o mundo a partir da década de 1970.

domingo, 2 de dezembro de 2012

"A imaginação é um músculo que se trabalha"

Depois de algum tempo sem postar nada nesse blog volto em grande estilo para falar da conferência “Palavra de Ator” e do lançamento do livro homônimo do meu amigo e professor Maurice Durozier, do Théâtre du Soleil. Posso parecer suspeita para falar do tema (é a quarta vez que a assisto: estava na estréia, nas tentativas de versões mais longas e mais enxutas, em Recife, em Natal, no Rio, em São Paulo, nos bastidores...) mas asseguro que é uma bela e importante experiência.
Maurice fala de forma franca e divertida sobre o oficio do ator, as dúvidas e angústias que nos perseguem. E, confesso, é bom ouvir um grande ator descrevendo  o terror dos primeiros anos de carreira, atrás das cortinas, instantes antes de entrar em cena, ou de improvisar diante de sua diretora (o que Ariane Mnouchkine chama de “pânico sagrado”!).  E nos dá lições preciosas: “para ser ator, é necessário manter aberta a porta da infância” e (parafraseando Ariane) “a imaginação é um músculo que se trabalha”.
Sobre a conferência, nas palavra de Maurice: “A minha família já fazia teatro há quatro gerações e então eu caí nesse mundo quando era bebê. Não gostava de estar no palco: gritava, chorava, contaram-me depois. Fui criado por meus avós, que eram atores e, em casa, não havia separação entre as coisas da vida e do teatro. Depois, quando voltei a fazer teatro, com 16-17 anos, entrar no palco era como estar na minha casa. Mais tarde entrei nesse grupo. Nele fazemos peças muito longas. Portanto são horas e horas nesse outro mundo. No outro lado do espelho. Nesse mundo vivo tudo que tenho que viver como ator, mas, saindo do palco, sensações, reflexões, pensamentos, crônicas, sempre chegavam e pensei que agora era o momento para falar disso: da vida do ator a partir do interior, do que está acontecendo dentro dele.”

Maurice Durozier,
como ator do Théâtre du Soleil, participou de espetáculos como “Richard II”“La nuit des rois”, “Henry IV” de W. Shakespeare, “Les Atrides” de Euripide et Eschyle entre outros. Na própria companhia a “Les voyageurs de la nuit”, escreve, dirige e atua. “Kalo”, uma peça sobre ciganos, recebeu o prêmio Villa Médicis hors les murs 1993. Orientou oficinas e cursos em países como França, Brasil, Argentina, Espanha, Afeganistão. Atuou no cinema em filmes como “En un mot”, de Jacques Rouffio (1985), “Les éphémères”, de Ariane Mnouchkine (2009) entre outros.

O livro Palavra de Ator, de Maurice Durozier, foi impresso pela Cepe e editado pela Prefeitura do Recife. Assim, quem não puder assisti-lo em suas andanças pelo país poderá ter acesso ao texto integral da conferência. A primeira parte é composta pelos capítulos: “A ilusão e a verdade; “O nascimento do ator”; “O sagrado”; “O teatro novayorkino” e “O teatro e a vida”. A segunda parte trata de temas como o teatro indiano, o narcisismo, as emoções, os momentos de revelação artística e o impacto da vida sobre a arte.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Lentes pernambucanas captam São Paulo

Programa - FOLHA PE 25/07/2012

Leonardo Lacca usa a metrópole como cenário para “Permanência” 

por LUIZ JOAQUIM 

Pedro Sotero/Divulgação
IRANDHIR Santos protogoniza filme como o fotógrafo Ivo
Se o leitor acha que o cinema pernambucano é audacioso pelas notícias que sabe sobre a produção local, precisa descobrir a história por trás da realização do mais novo filme do Estado, “Permanência” - estreia de Leonardo Lacca, da Trincheira Filmes, na direção de um longa-metragem.

Como se não bastasse o baixíssimo orçamento para as filmagens - de R$ 395 mil, fruto exclusivo do edital do audivisual do Governo do Estado -, todas as imagens que compõem “Permanência” foram captadas em São Paulo, capital.

Por três semanas, Lacca, a produtora executiva Emilie Lesclaux - da CinemaScopio -, e uma equipe de 25 pessoas, se instalaram na capital paulista para seguir fielmente ao cronograma das filmagens e rodar as imagens que darão corpo ao drama sobre os reencontros do fotógrafo Ivo (vivido por Irandhir Santos).

“Nosso receio era saber que numa cidade que não é a nossa nós não poderíamos contar com amigos para uma emergência na produção. Por outro lado, em alguns aspectos da produção, estar em São Paulo facilitou nosso trabalho, uma vez que encontrávamos empresas específicas para necessidades específicas para, por exemplo, a direção de arte, feita por Juliano Dornelles”, recorda o cineasta.

Mas por que São Paulo? “É uma história universal, que poderia se passar em qualquer grande metrópole do mundo, mas a idéia de estar lá agregava não só aos atores, mas também à equipe a sensação e desconforto do deslocamento. É um filme em que o ‘estar em outra cidade’ diz muito”, explica.

Sobre o enredo, Lacca não adianta muito, mas revela que a sensação que experimentou (e ofereceu) no seu curta-metragem “Décimo Segundo”, premiado com melhor direção no Festival de Brasília em 2007, foi desenvolvida e amplificada em “Permanência”.

“No curta, havia uma relação desequilibrada no reencontro do personagem de Irandhir com o de Rita [Carelli, também no longa]. Em ‘Permanência’, nem ele, nem ela, está por ci­ma”, diz. Nesse novo reencontro com essa mulher, desenha­do pelo diretor, Ivo também é próximo do marido dela, Mauro (Silvio Restiffe), do pai (Genésio de Barros), além de uma nova mulher, Laís (Laila Pas).

Ansioso para começar a montar o filme - “ainda estou muito impregnado pelas filmagens”, encerradas há alguns dias -, Lacca terá, na verdade, que administrar seu desejo. Fotografado por Pedro Sotero com uma câmera de tecnologia RED (que captura com resolução de 4520 x 2540 pixels, ou 4k), o diretor tem nas mãos dois terabytes de memória carregada com imagem digital em movimento, ou seja, algo em torno de 27 horas de imagens brutas.

“É a primeira vez que não consigo trabalhar, por questões técnicas, com meu laptop para montar um filme que faço”, surpreende-se. Mas, mesmo que pudesse, Lacca não o faria. Além do longa, ele está envolvido no momento na conclusão da montagem de “Animal Político”, longa-metragem de estreia de Tião (integrante da Trincheira e autor do curta “Muro”), e também num outro longa, “Seu Severino”, que prepara sobre seu avô a partir de imagens de arquivo e que deve ser editado junto com os irmãos Luiz e Ricardo Pretti, do Ceará.

“Na verdade, quero dividir a tarefa da montagem de ‘Permanência’ com outra pessoa, e vou dar ao filme o tempo dele. É ele [o filme] que vai dizer o ritmo dessa montagem”, comenta. Para Lacca, o segundo semestre de 2013 é um período possível para o lançamento de “Permanência”.

domingo, 5 de agosto de 2012

A Aventura Shakespeariana

Esta semana fui assistir "Sua Incelença, Ricardo III" do grupo Clowns de Shakespeare, de Natal. Com direção de Gabriel Villela e seus figurinos impecáveis, excelentes atores e soluções cênicas divertidas e surpreendentes e digo: o brado desta Inglaterra sertaneja vale a pena ser visto e ouvido. É de graça, no SESC Belenzinho, tem um ótimo trabalho musical e convenhamos, trata-se de um texto de Shakespeare.

No teatro, pessoas podem dar bons mestres, máscaras podem ser mestres vitais para um ator, mas alguns textos também o são. Os de Shakespeare com certeza se enquadram nessa categoria. Vale lembrar que "o Bardo", além de dramaturgo e diretor, era chefe de Companhia e, com seus espetáculos, tinha por obrigação alimentar seus atores; e a concorrência, na época não era fraca. Quer motivação melhor do que a fome? Além disso, tudo que era escrito era encenado, dito, testado, e Shakespeare podia reescrever falas ou passagens de acordo com a reação do público. Esse textos chegam a nós mais do que burilados e milhares de vezes confrontados com os espectadores. Não resta dúvidas: são bons.

Tão bons que um dos meus mestres, Maurice Durozier, do Théâtre du Soleil, me chamou, no ano passado, para ir com ele à Natal trabalhar um pouco de tragédia shakespeariana, a título pedagógico, justamente com meus amigos dos Clowns de Shakespeare, no Rio Grande no Norte. Juntos, partimos em uma aventura incrível: labutar, durante uma semana, sobre o texto Ricardo II, a partir da montagem deste feita pelo Théâtre du Soleil na década de 80. Ou seja, mergulhar na guerra de sucessão do trono da Inglaterra Medieval inspirados do Teatro Nô, Japonês. (Realmente Ariane Mnoushkine têm umas idéias supreendentes!).

Compramos quimonos, tecidos, meias para os cabelos, faixas e atacamos, diretamente, o palco. Com o texto numa das mãos e as rédeas de cavalos imaginários na outra, nós lançamos. É incrível entender o significado de uma frase no momento em que se é confrontado a ela. No mesmo momento em que se é tomado pela emoção da cena.  Durante uma semana fomos reis, rainhas, criados, marechais, guerreiros, covardes, leais, cavaleiros, conspiradores, assassinos... Durante uma semana cavalgamos por prados infindáveis, escalamos torres, amaldiçoamos, fomos amaldiçoados, sofremos e amamos. Tudo sob a condução apaixonada de Maurice e as boas estrelas de Shakespeare, do Soleil, e do caminho luminoso dos Clowns. 


segunda-feira, 2 de julho de 2012

Menos é Mais?!

Saindo do set do meu primeiro longa (primeiro que eu faço mais do que uma pequena participação em que o espectador corre o risco de não me ver caso se distraia por alguns segundos), cheia de ansiedades, fui tomar uma cerveja com um amigo na augusta (santo remédio!). Eu tinha passado no cinema antes para assistir "Febre do Rato" e começamos a conversar sobre as coisas loucas que éramos capazes de fazer por uma cena e debater sobre a natureza masoquista dos atores. Nos questionamos sobre os sacrifícios físicos e as angustias servirem de motor para a criação ou, no mínimo, fazerem de nós os instrumentos perfeitos para a loucura dos diretores. 

Ele me perguntou por qual trabalho eu tinha ficado careca no ano anterior, contei que era para um curta de Daniel Bandeira e Pedro Sotero: "Sob a Pele". O mesmo que me custou 30 horas de pintura corporal para ter o corpo inteiro tatuado, mais 3 horas de retoque diários e quase 10 dias sem tomar banho. Depois do segundo dia de aplicação das tatuagens eu comecei a vomitar por passar tantas horas de bruço. No penúltimo dia de filmagem eu e o outro ator, Mariano Mattos, tivemos que ficar 4 horas deitados, abraçados, imóveis enquanto nos "colavam" um ao outro com silicone líquido.

Certamente a minha história era boa, mas a dele não ficava atrás.  Sua preparadora vocal disse que se nos mandassem pular de um precípicio, nós o faríamos. Ele respondeu que, felizmente, ainda não tinha sido confrontado a essa situação, mas que já tinha se jogado de um cavalo em movimento durante uma cena de tiroteio em "O Menino da Porteira". Quando lhe explicaram a cena ele disse: tudo bem; pediu uma égua mansa e treinou pacientemente durante todo o dia os movimentos do tiro, da descida do bicho. Primeiro com ela parada, em seguida com ela caminhando, como cair e se afastar das patas dela para não ser pisoteado, etc. Finalmente na hora de gravar a cena - um plano sequˆncia com tiros e perseguição - ele esporeou a égua pela primeira vez, se jogou e saiu rolando pelo chão. Foi quando o diretor cortou e disse: "Mas por que você saiu rolando pra fora do quadro?? Olha, eu vou te dar uma dica: no cinema o menos e mais!" Rimos.

Bem, já era tarde. Ele me perguntou: "E você filma este final de semana?" "Sim, vou levar uma anestesia para fazer uma cena em que eu acabei de sair do dentista!". Caímos na gargalhada. Hoje, ainda com a boca inchada posso dizer que não tomei uma, mas várias anesterias até chegar ao estado de deformação que o diretor queria. Só espero que meu rosto volte ao normal. Pelo menos, quando nos sentarmos de novo numa mesa de bar, agente tem histórias novas pra contar!


sábado, 16 de junho de 2012

Sobre a importância da permanência

Há três dias de entrar no set de "Permanência", primeiro longa de Leonardo Lacca, encontro com dificuldade alguma concentração para escrever. Estávamos, há sete anos atrás, eu, Irandhir Santos, Leo, Marcelo Lordello e outros no set de "Décimo Segundo", em Recife, com nenhum dinheiro e cheios de gana, rodando o que viria a ser a semente desse longa que agora iniciamos. Hoje, apesar da distância que separa os dois trabalhos (de tempo, amadurecimento, profissionalismo, estética, narrativa), de tantas outras pessoas que foram incorporadas ao projeto, faço um brinde a "Décimo". Esse curta que nos rendeu tantas alegrias, vaias, aplausos, que nos pagou, figurada e literalmente, em prêmios. Esse filme que foi feito pelo desejo de ser feito e nada mais. Que nos ensinou tanto, que me rendeu uma gastrite (depois de tantos cigarros e cafés em um único dia!) e amizades que me são tão caras.

Nem todo mundo conhece a curiosa história desse curta. Pois bem, vou contá-la. Trata-se de um filme com apenas 3 planos. Dois que podemos chemar de "introdutórios" e um longo plano de aproximadamente 12 minutos. Este plano foi repetido durante as 12 horas de set, o que nos rendeu - com os ajustes entre cada um deles e o desconto dos outros 2 -  12 repetições. Juro! Entramos no set cerca de 5 horas da manhã  e, próximo das 5 da tarde, Leo ainda não estava satisfeito. A luz já começara a cair e tínhamos uma última chance para acertar nossa coreografia de atores e câmera, fios e intenções. Era o décimo segundo take. Quando terminamos a cena - que contava com Irandhir subir correndo tantos lances de escada e chegar na hora certa, Marcelo subir com a câmera esses mesmo andares de elevador filmando, sem incidentes, eu preparar um café na moka, sair de quadro, prender o cabelo e voltar no tempo exato de tirar o café do fogo - e Leo nos olhou e disse o tão esperado "valeu", um alívio geral e uma enorme alegria tomou conta de nós. É este plano que está no filme.

E, apesar de termos afastado de nós a memória do curta durante o processo de preparação do longa (para sermos capazes de criar algo novo, que faça sentido para todos os que estão nesse filme de agora, que os inclua, que incorpore nossas transformações pessoais) é com essa lembrança que vou pisar no set na quarta-feira. Com essa lembrança de confluência do cosmos, de alguma sorte, algum tipo de benção, mas também de parceria e trabalho intenso. Leo me disse que se sente privilegiado por estar estar fazendo seu filme, por ter chegado até aqui, por ver tantas pessoas trabalhando para que ele dê certo. Isso mê fez lembrar de tudo isso. Da parte bonita e anedótica da história, mas também dos 5 anos que ficamos tentando financiamento para o filme, das longas conversas em que eu tentava reanimar o Leo a tentar de novo, em que revíamos a justificativa do projeto, em que ele cogitava transformar completamente o roteiro para ser mais palatável aos jurados de tal ou tal edital e eu pregava que ele deveria defender o filme em que acreditava, que só valeria a pena se fosse assim. E digo: somos privilegiados, sim, mas também somos merecedores. Um brinde a "Décimo" e um a... "Permanência"!



domingo, 10 de junho de 2012

Na oficina de Mestre Erhard

Há cerca de três anos eu andava em Paris, absolutamente apaixonada pela descoberta das máscaras, e o querido Maurice Durozier me conseguiu um encontro com Erhard Stiefel, mestre de máscaras do Théâtre du Soleil. Cheguei na Cartoucherie, sede da companhia, pelo menos meia hora antes do combinado. Estava ansiosa para encontrar esse grande mestre de máscaras, mas também queria aproveitar a desculpa de ter um conpromisso por lá para perambular um pouco por esse espaço mágico de trabalho e criação. 

Os atores e técnicos estavam em plena construção dos cenários do último espetáculo da trupe: Os Náufragos da Louca Esperança. Encontrei alguns conhecidos: um ex-colega da minha turma de escola de teatro (Jacques Lecoq), uma ou duas estagiárias brasileiras que trabalhavam ajudando na oficina, uma atriz amiga minha, Maurice, claro, e outros artistas que eu admirava do palco. O clima era festivo, mas ressendia a suor e trabalho duro. Enchi os pulmões daquele ar e fui bater na oficina do Mestre Erhard. Ele também parecia atarantado com tantas demandas de última hora, imitava Ariane de um jeito cômico: "Erhard, só você sabe fazer isso, Erhard, só você pode fazer aquilo!" E completava: "Mas no final, eu não posso resistir a nada do que ela me pede! O que é eu posso fazer? São tantos anos juntos, isso parece um casamento!" Me olhou. "Bem, você deve ser a Rita, me passe aquela lata de verniz." E foi assim que começaram as valiosas lições de Erhard.

Ele acabara de chegar do Japão, onde estivera à convite, reproduzindo algumas rarríssimas e valiosas máscaras do teatro Nô. Estava indisfarçavelmente orgulhoso de sua tarefa e falava enquanto trabalhava: "Nunca tinham deixado um estrangeiro a sós com aquelas máscaras, nunca!". Contou que teve que pedir uma mesa para trabalhar, pois o tatame estava acabando com as suas costas, mas que tinha ficado satisfeito com o resultado. Depois de algumas horas de trabalho e prosa ele me olhou de alto abaixo e voltou com três sacos de tecido. Me estendeu o primeiro. Quase caí pra trás quando vi que era uma das réplicas do tesouro nacional japonês na qual ele andara trabalhando tanto! "Cuidado!" - gritou ele à sua maneira enérgica. "Trouxe elas para pintar aqui, mas não encoste o dedo na madeira, pois a gordura do seu dedo vai isolá-la da pintura com porcelana, entendeu?!". E eu? Bem, eu acatava cada uma de suas ordens com um sorriso de orelha à orelha! Afinal, mestre é mestre!



sexta-feira, 8 de junho de 2012

Na Corte da Rainha

Durante o segundo semestre de 2011 tive a oportunidade de acompanhar várias oficinas ministradas pelos artistas do Théâtre du Soleil no Brasil. Foi durante um estágio no SESC Belenzinho, em São Paulo, ministrado por Duccio Bellugi e Eve Doe Bruce, que eu entrei em contato pela primeira vez com uma máscara balinesa de Topeng. Na vespera tínhamos trabalhado com Serge Nicolaï e Olivia Corsini, um treinamento inspirado nas marionetes japonesas, e, antes disso, com Maurice Durozier e Juliana Carneiro da Cunha, sobre as noções de coro e corifeu, mas foi o encontro com as máscaras que mais me marcou.

Faltando pouco tempo para o fim da sessão de trabalho, depois muitas horas de treinamento físico e improvisação, Duccio e Eve dispuseram cuidadosamente as máscaras sobre um tecido e pediram 3 ou 4 voluntários para experimentá-las. Era o momento que eu tinha esperado durante todo aquele dia. Levantei-me de um salto e consegui estar entre os escolhidos numa audiência de mais de cem pessoas.

Nos foram oferecidas máscaras de bondrés,  ou seja, os personagens cômicos do Topeng, os personagens vulgares, do povo. Dizem que é a máscara que nos escolhe e não o contrário, e é verdade. Quando eu vi entre elas aquele jovem senhor desdentado, de olhos esbugalhados... eu me apaixonei! Tudo que eu queria era estar a seu serviço, dar-lhe um corpo, emprestar vida aos seus anseios. Nós, porém, não tínhamos o direito de vestir as máscaras: trabalhávamos segurando-as com a mão direita, com um pano envolvendo nosso braço. Mas assim mesmo respirando com elas, olhando com elas, vivendo através delas.

Foi quando Duccio me apontou e disse: "Você, para trás!" Não entendi sua intenção, mas tive a sensação de que algo importante estava prestes a acontecer. Me retirei da cena e logo Eve veio se juntar a mim. Começou a me vestir com uns tecidos e diante da minha surpresa ela disse, com um sorriso: "Sim, você terá o direito de vestir a máscara". Meu coração começou a bater mais forte e, quando a cortina se abriu eu era um camponês apaixonado pela rainha se apresentando diante da corte para uma louca declaração de amor. Duccio dizia: "Sim! Sim!". E me alimentava com estados de alma e poderações que "o" levavam (a máscara) do deleite completo ao pânico absoluto.

 A cena deve ter durado não mais do que 5 minutos (o tempo que faltava para o fim do estágio) mas a mágica daquele instante me grudou na pele, como uma tatuagem. São esses preciosos momentos de teatro abençoados pela graça dos quais nos lembraremos para a vida inteira.



Duccio Bellugi Vannuccini é diplomado na escola de Marcel Marceau, estudou nada mais nada menos do que com Pina Bauch, Jaques Lecoq, Etienne Decroux, Annie Fratellini e integra o Théâtre du Soleil desde 1987.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Improvisação com Máscaras Balinesas, por Stephane Brodt







"Sobrevivente de uma época em que o teatro era apresentado em praças públicas, a máscara é um instrumento de formação essencial para o ator. As regras que se aplicam a esta forma teatral convidam o ator a entrar numa cena vazia, tendo como único recurso o corpo, a imaginação e a emoção. Seu modo improvisado rompe com a interpretação naturalista e psicológica e desenvolve a imaginação, a presença cênica e o engajamento físico do ator.

O teatro de máscaras balinesas, o topeng, é um teatro dançado e cantado, que se situa entre o sagrado e o profano. Ele é constituído por personagens nobres e vários personagens cômicos, os bondrés. Apesar da distância cultural e geográfica, a tradição italiana e balinesa de teatro de máscara apresentam inúmeras semelhanças. A força das máscaras balinesas é que elas pertencem a uma tradição que não se degradou. A qualidade da escultura e a habilidade do jogo dramático permanecem intactas.

Em curso, não procuramos trabalhar segundo a tradição balinesa mas, ainda que guardando suas próprias características, as máscaras são colocadas à serviço de um teatro e de histórias que pertencem a nossa cultura. A precisão física, a simplicidade e a sinceridade do jogo com máscaras, preparam o ator para abordar qualquer forma teatral."

Stephane Brodt

é diretor e ator do AMOK TEATRO, no Rio de Janeiro. Formado na Escola Catherine Brieux (Comédie Française), estudou na Escola Internacional do Mimodrama de Paris - Marcel Marceau e na Escola de Mímica Corporal Dramática de Paris onde trabalhou a técnica de Etienne Decroux. Em 1991, ingressou na Cia Théâtre du Soleil, e, sob a direção de Arianne Mnouchkine, participou dos espetáculos “Iphigenie”, “Agamemnon”, “Les Eumenides” entre outros. Entre 1991 e 1997, passou várias temporadas em Bali estudando com mestres diferentes estilos de Topeng (teatro tradicional de máscaras) e escultura de máscaras. Em 1994, fundou na França o Toko Teatro e dirigiu o espetáculo “Conteurs”. Em 1998, fundou, com Ana Teixeira, a Cia Amok Teatro. Com o monólogo “Cartas de Rodez” (1998) recebeu o Prêmio Shell de Melhor Ator. Em 2003, com “Macbeth”, de Shakespeare, interpretou o papel título. Em 2008, com o “O Dragão”, foi indicado ao Prêmio Quem de Melhor Ator. Atualmente é curador do ECUM - Encontro Mundial das Artes Cênicas.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Neutro Feminino e Neutro Masculino?

Apenas a título de informação, respondendo a algumas demandas, a imagem de máscara neutra, reproduzida no post "Máscara Neutra" é feminina. Sim, o neutro têm feminino! E masculino, evidentemente. O ator, ou a atriz, ao buscar a "neutralidade", vai tentar aproximar-se do neutro com o seu corpo, a partir de suas caractarísticas essênciais (humano, feminino ou masculino). A mulher que portar uma máscara neutra vai interpretar A Mulher. O mesmo sendo válido para os homens. Reproduzo abaixo um casal de máscaras neutras, também de Amleto Sartori:



segunda-feira, 4 de junho de 2012

Clowns de Shakespeare


Ontem fui assistir ao espetáculo "O Capitão e a Sereia" do gurpo "Clowns de Shakespeare", de Natal. Eles vieram a São Paulo no contexto do projeto de ocupação da Funarte: "Nova Cena Nordestina". A má notícia é que a temporada do belíssimo espetáculo dos Clowns de Shakespeare - inspirado no livro honônimo de André Neves e dirigido por Fernando Yamamoto - terminou ontem. A boa notícia é que o projeto segue agora com o grupo "Magiluth", de Recife e recebe em seguida "A Outra Companhia de Teatro", de Salvador (com a qual colaborei durante dois anos).

Mas quem nunca assistiu os Clowns em ação, ou quem, como eu, é fã, não precisa se descabelar: eles voltam já com o esperado "Sua Incelença, Ricardo III", com direção de Gabriel Villela. Estarão em cartaz a partir do final de julho no SESC Belenzinho. Só digo que estarei aguardando ansiosamente esse Shakespeare nordestino, de palhaços mambembes e carroças ciganas, entre o sertão e a Inglaterra Elizabetana... Que venham! 




"Mil corações batem vivos em meu peito. Avançai, estandartes nossos! Lançai-vos sobre o inimigo! Que nosso velho brado de coragem, “por São Jorge”, nos inspire com o alento de dragões de fogo!" 
(Ricardo III, de William Shakespeare)

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Ah, as Larvárias!

 
Bem, dando continuidade ao périplo das máscaras aqui estão as deliciosas Máscaras Larvárias. Essas máscaras não são, em sua origem, máscaras de teatro, mas máscaras de carnaval. Isso mesmo. As larvárias são naturais de Basel, na Suíça e têm esse nome por se tratarem de seres em formação (do radical larva).  Essas adoráveis criaturas – entre o humano e o animal – não se caracterizam exatamente como personagens, mas apontam direções de exploração para os atores. Literalmente.
Lecoq e Sartori, mais uma vez, é quem foram resgatar esse tesouro para o domínio teatral. Eles se deram conta, com toda razão, que os traços claros, simples e exagerados das larvárias apresentavam um excelente caminho de introdução ao universo das máscaras expressivas. Na década de 60 Lecoq foi buscá-las e as incorporou ao método pedagógico de sua escola. Suas linhas bem definidas permitem aos atores encontrar rapidamente um corpo possível para portá-las lhes proporcionando, de forma quase indolor e instantânea, a mágica de vibrar em harmonia com uma máscara.
E uma vez que essa mágica acontece, os atores são dominados por ela: o mundo mágico das máscaras se abre diante deles com suas infinitas possibilidades. Pensando bem, as Máscaras Larvárias, com essas carinhas inocentes e sua enorme generosidade são perfeitas aliciadoras! Mas que prazer ser “possuído” por elas!


domingo, 27 de maio de 2012

A Máscara no Trabalho do Théâtre du Soleil


Copio aqui trechos que selecionei da fala de Ariane Mnouchkine, sobre o uso das Máscaras em sua companhia, em entrevista à Odette Aslan:

 "(...)Utilizamos a máscara porque ela rapidamente se impôs. Se atores que querem improvisar no teatro contemporâneo não encontram rapidamente os meios de tomar uma certa distancia a fim de chegarem a uma forma, correm o risco de se atrapalharem de caírem no psicológico, no paródico, na derrisão e em outras armadilhas que nós queríamos evitar. Percebemos que a máscara impunha um tal trabalho sobre o signo teatral, sobre a maneira de representar as coisas, que ela constituía uma disciplina de base e esta disciplina tornou-se indispensável para nós.
(...)
Eu diria que a máscara é nossa disciplina de base porque ela é uma forma e qualquer forma impõe uma disciplina. O ator produz no ar uma escrita, ele escreve com seu corpo, é um escritor no espaço. Nenhum conteúdo pode exprimir-se sem forma. Existem várias formas, mas talvez para alcançar-se algumas delas, haja uma única: disciplina. Acredito que o teatro é um vaivém entre o que existe de mais íntimo em nós, de mais ignorado, e sua projeção, sua exteriorização máxima em direção ao publico. A máscara requer precisamente esta interiorização e esta exteriorização máximas. Um certo tipo de cinema e de telivisão habituou-nos ao “psicológico”, ao realismo, ao contrário de uma forma, portanto, ao contrário da arte: dispomos os atores num cenário, mas o palco não lhes pertence realmente. Enquanto que, com a máscara, eles criam seu próprio universo a cada instante. As grandes tradições teatrais, as grandes formas de representação utilizam a máscara (da tragédia grega aos teatros orientais).
(...)
No Théâtre Du Soleil, praticamos muitos exercícios com máscaras expressivas, para nós a máscara constitui a formação esencial do ator. A partir do momento em que um ator “encontra” sua máscara, ele está próximo da possessão, ele pode deixar-se possuir pelo personagem. Alguns sufocam, literalmente, ficam sem voz, sem olhos, sem corpo, aniquilados pela máscara. Outros a atravessam e esta travessia é dolorosa. Pede-se a eles que sejam “visionários” que encarnem poemas, imagens, visões, eles devem levar em conta tanto o  mundo exterior - aquele no qual se passa a peça e o espetáculo - quanto o seu mundo inferior - o do personagem. É uma tarefa cansativa, que não deixa intactos nem seu corpo, nem sua alma, uma tarefa atlética para o corpo, a imaginação, o coração e os sentidos.
(...)
No teatro, o corpo inteiro é a máscara. Não se pode dizer que o fato de usar uma máscara acarrete um ritmo particular. É o personagem - a máscara - que adquire seu ritmo interior, suscetível de variar segundo o estado ou a emoção. Também não se pode dizer que a utilização da máscara imponha tal ou tal movimento da cabeça e do pescoço. (...) Nunca pensamos em usufruir de algo já adquirido no domínio da máscara. A maior aquisição é saber que não há aquisições."

Dezembro de 1982


sábado, 26 de maio de 2012

Quem são os Deuses do cinema?


Sou, me considero, uma mulher do teatro. Cresci frequentando a coxia de um - o teatro Vila Velha, em Salvador, onde trabalha minha tia, atriz e diretora, Chica Carelli. Cresci decorando as falas de todos os personagens das peças em cartaz e divertindo os atores nos camarins, imitando à um ou à outro, a pedido dos mesmos. Cresci assistindo ensaios e peças da cabine de luz. Os avessos, as discórdias, as descobertas. Os dias em que os "Deuses do Teatro" (como diz meu professor e amigo Maurice Durozier, do Théâtre du Soleil) resolvem abençoar o palco, os dias em que Eles lhe viram as costas. Mas são Deuses e Dêmonios com quem aprendi a conviver e respeitar. Inventamos uma prece ou duas - seja com palavras ou silêncios - trabalhamos duro e confiamos que naquela noite, mais uma vez, a mágica irá acontecer.

Mas nesses últimos tempos tenho flertado com o cinema. Que, me parece, é regido por outras Criaturas, ou Criadores, outras Leis, ainda por mim desconhecidas. Estou em processo de ensaio de um longa. Faltam 20 dias para o início das filmagens e as vezes sou tomada por uma angustia sem forma. Na falta de um canal de comunicação direta com esses "Novos Deuses", ontem à noite, via skype, me apareceu um anjo. Outro amigo querido, William Nadylam, ligou de Londres, onde está em cartaz com "The Suit" de Peter Brook, ouviu minhas inseguranças e me respondeu: "Um ator nunca está pronto, está sempre aprendendo. Não se preocupe, no cinema, a câmera vem te buscar, aonde quer que você esteja do teu caminho, do teu aprendizado. Eles vêm atrás de você, do que eles querem, do que eles precisam para contar aquela história. Seja sincera, verdadeira e, sobretudo, mantenha-se calma."

Terá sido um Sinal?
Fui dormir no céu! 

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Máscara Neutra

Bem, para dar início ao "Périplo das Máscaras" escolhi um belo exemplar da famosa máscara neutra, confeccionada por Amleto Sartori. 


Se quisessemos nos ater a uma coerência cronológia, mais justo seria começar pelas máscaras do teatro grego, ou melhor ainda, por máscaras tradicionais dos aborígenes de Papua Nova Guiné, ou tantos outros povos antigos que que as criaram e vereraram, com as formas mais loucas e dos materiais mais diversos como a própria humanidade. Mas às favas com a cronologia. Vamos seguir, antes, uma lógica moderna do estudo das máscaras aplicada ao trabalho do ator. Voltaremos à essas maravilhas da invencionice humana mais tarde. Por hora apresento-lhes essa jóia de pele de um dos maiores mascareiros do ocidente e, na minha opinião, a mais difícil das máscaras.

Entrei pelo teatro pela porta dos fundos, como palhaça, e a noção do neutro me acertou na cara, como uma bofetada. Fiz minha iniciação na máscara neutra justamente com uma máscara de Sartori - já que era necessário sofrer, que fosse em grande estilo!. Um exemplar realizado a pedido de seu amigo e colega Jacques Lecoq, para sua escola, em Paris. No primeiro exercício minha professora me disse: "Você aí, o que você está fazendo? Você parece uma velha de 70 anos!". Meu corpo estava marcado pelo trabalho de palhaço e, com a implacável máscara neutra colada ao rosto, a única coisa que se via em mim era a curva do torço, o pé esquerdo que levantava mais do que o direito quando eu caminhava, a tensão das mãos, enfim, todos os "tortos" que eu levara tanto tempo aflorando e assumindo para dar corpo à Clarabela - minha palhaça e companheira de alguns anos já. 

A volta ao neutro, no entanto, ou a tentativa de volta - já que o neutro é uma utopia e, por definicão, inalcançável- me ajudou a me libertar de mim mesma. Dos vícios e marcas do meu próprio corpo. Me limpando, me tornando como uma página em branco, quase nova, quase imaculada, pronta a abraçar o que viria pela frente. Este é o segredo e a riqueza da máscara neutra e, para mim, uma das mais duras lições do teatro.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

A PORTA

Ontem, nos 45 minutos do segundo tempo (já que São Paulo está em clima de futebol), fui conferir a peça "A PORTA" da cia Troada, com direção de Vinicius Torres Machado - e recomendo. Eles encerram hoje a temporada no Teatro Sérgio Cardoso então, quem correr, ainda chega pros penaltis. As máscaras, confecionadas por uma das atrizes do grupo - Elisa Rossin - são notáveis e se prestam perfeitamente ao jogo proposto pela encenação. Com atores bem integrados e uma concepcão estética cuidadosa a peça nos arrasta para o universo onírico - ou "pesadelístico?" - de Franz Kafka. 

Como mascareira talvez minha opinião seja suspeita nesse campo, mas convenhamos, essas belíssimas máscaras inteiras - grandes professoras para qualquer ator! -, ao mesmo tempo exigentes e generosas, nos salvam da terrível verborragia que tantas vezes ameaça nossas noitadas teatrais. Gol da Troada!

A Porta

Cia. Troada reestreia o espetáculo A Porta no Teatro Sérgio Cardoso
A temporada segue até o dia 24, todas as quartas e quintas-feiras.

O Espetáculo A Porta, da Cia. Troada esta em cartaz no teatro Sérgio Cardoso, equipamento do Governo do Estado e Secretaria da Cultura. A peça de máscaras é livremente inspirada na obra de Franz Kafka. A proposta do grupo foi enfatizar os aspectos oníricos de sua criação e promete inovação na linguagem e na estética. A Porta fica em cartaz até o dia 24 de maio, sempre as quartas e quintas-feiras.

Com gênero tragicômico, todos os atores utilizam máscaras inteiras, sem fala, com traços caricaturescos da figura humana. O espetáculo conta a história de uma noite de insônia de Gregor, apresentando a comicidade da máscara em visita ao universo kafkiano. Nesse encontro, nasce um tipo de humor que tira sua força do “nonsense”, da brincadeira com o absurdo. As imagens labirínticas de Kafka possibilitaram uma encenação mais aberta, destacando também elementos que conferem à peça contornos de pesadelo. A porta do quarto de Gregor se transforma em uma passagem pela qual poderá voltar à realidade.

A concepção e direção são de Vinicius Torres Machado e a produção contou com o apoio do Prêmio Funarte Myriam Muniz de Teatro. O elenco é formado pelos atores Ana Caldas Lewinsohn, Beto Souza e Elisa Rossin. Os figurinos foram criados por Elisa Rossin e Eliseu Weide, que trabalha com importantes produções europeias de ópera e teatro, incluindo as companhias alemãs Berliner Ensemble e Cia. Familie Flöz, de Berlim.

A Cia. Troada, de São Paulo, é integrada por artistas formados pela USP e Unicamp, que pesquisam a linguagem da máscara desde 1999, em seus mais diversos trabalhos. As máscaras do espetáculo, confeccionadas por Elisa Rossin, atriz e mascareira da Cia., são inspiradas na estética da Familie Flöz, referência alemã do teatro de máscaras mundial.

A Porta - Teatro Sérgio Cardoso
Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista
Telefone (11) 3288-0136
Apresentações: quartas e quintas-feiras, às 21h
Temporada até o próximo dia 24 de maio
Sensura:  14 anos
Lotação: 144 lugares
Quanto: R$ 20,00 R$ 10,00 (meia)
Ingressos: a venda na bilheteria do teatro e pelo site Ingresso Rápido (http://www.ingressorapido.com.br
Fonte: Assessoria de imprensa - SEC
Data: 14/05/2012

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Boas Vindas

Caríssimos, 

inicío na madrugada de hoje, oficialmente, este blog, que já há algum tempo buli em mim. A idéia nasceu durante o último curso de teatro de máscaras que ministrei em Recife, a convite o Coletivo Angu de Teatro, no Espaço Experimental, em março deste ano. Gostaria de criar aqui um espaço de reflexão sobre o fazer teatral em suas diferentes formas, a partir da minha experiência. Um espaço de diálogo e troca pra lá da sala de aula, das salas de ensaio, das conversas de bar e da ligeireza do facebook. Nosso carro chefe será o teatro, mas o cinema, e eventualmente outras formas de arte, também estão convidadas a participar na medida em que  contribuirem para nossa caixa de ferramentas.

Decidi chamá-lo "Bôite à Outils" não por esnobismo, mas por que a inspiração me veio assim. Já que defendo que coloquemos em nossa caixa tudo aquilo que nos puder ajudar: as figuras do cavalo marinho, as máscaras balinesas, o Nô, a caveira de Hamlet, excercícios do mestre Lecoq, brincadeiras de palhaço, Arlequins e Pantalones, lições de Brook...  porque não um nome em francês? Nosso terreno de experimentação é o mundo, então: sejam bem vindos. Como diria um amigo meu: "fique à vontade, puxe uma cadeira e sente no chão".

Com amor,
Rita.