terça-feira, 14 de agosto de 2012

Lentes pernambucanas captam São Paulo

Programa - FOLHA PE 25/07/2012

Leonardo Lacca usa a metrópole como cenário para “Permanência” 

por LUIZ JOAQUIM 

Pedro Sotero/Divulgação
IRANDHIR Santos protogoniza filme como o fotógrafo Ivo
Se o leitor acha que o cinema pernambucano é audacioso pelas notícias que sabe sobre a produção local, precisa descobrir a história por trás da realização do mais novo filme do Estado, “Permanência” - estreia de Leonardo Lacca, da Trincheira Filmes, na direção de um longa-metragem.

Como se não bastasse o baixíssimo orçamento para as filmagens - de R$ 395 mil, fruto exclusivo do edital do audivisual do Governo do Estado -, todas as imagens que compõem “Permanência” foram captadas em São Paulo, capital.

Por três semanas, Lacca, a produtora executiva Emilie Lesclaux - da CinemaScopio -, e uma equipe de 25 pessoas, se instalaram na capital paulista para seguir fielmente ao cronograma das filmagens e rodar as imagens que darão corpo ao drama sobre os reencontros do fotógrafo Ivo (vivido por Irandhir Santos).

“Nosso receio era saber que numa cidade que não é a nossa nós não poderíamos contar com amigos para uma emergência na produção. Por outro lado, em alguns aspectos da produção, estar em São Paulo facilitou nosso trabalho, uma vez que encontrávamos empresas específicas para necessidades específicas para, por exemplo, a direção de arte, feita por Juliano Dornelles”, recorda o cineasta.

Mas por que São Paulo? “É uma história universal, que poderia se passar em qualquer grande metrópole do mundo, mas a idéia de estar lá agregava não só aos atores, mas também à equipe a sensação e desconforto do deslocamento. É um filme em que o ‘estar em outra cidade’ diz muito”, explica.

Sobre o enredo, Lacca não adianta muito, mas revela que a sensação que experimentou (e ofereceu) no seu curta-metragem “Décimo Segundo”, premiado com melhor direção no Festival de Brasília em 2007, foi desenvolvida e amplificada em “Permanência”.

“No curta, havia uma relação desequilibrada no reencontro do personagem de Irandhir com o de Rita [Carelli, também no longa]. Em ‘Permanência’, nem ele, nem ela, está por ci­ma”, diz. Nesse novo reencontro com essa mulher, desenha­do pelo diretor, Ivo também é próximo do marido dela, Mauro (Silvio Restiffe), do pai (Genésio de Barros), além de uma nova mulher, Laís (Laila Pas).

Ansioso para começar a montar o filme - “ainda estou muito impregnado pelas filmagens”, encerradas há alguns dias -, Lacca terá, na verdade, que administrar seu desejo. Fotografado por Pedro Sotero com uma câmera de tecnologia RED (que captura com resolução de 4520 x 2540 pixels, ou 4k), o diretor tem nas mãos dois terabytes de memória carregada com imagem digital em movimento, ou seja, algo em torno de 27 horas de imagens brutas.

“É a primeira vez que não consigo trabalhar, por questões técnicas, com meu laptop para montar um filme que faço”, surpreende-se. Mas, mesmo que pudesse, Lacca não o faria. Além do longa, ele está envolvido no momento na conclusão da montagem de “Animal Político”, longa-metragem de estreia de Tião (integrante da Trincheira e autor do curta “Muro”), e também num outro longa, “Seu Severino”, que prepara sobre seu avô a partir de imagens de arquivo e que deve ser editado junto com os irmãos Luiz e Ricardo Pretti, do Ceará.

“Na verdade, quero dividir a tarefa da montagem de ‘Permanência’ com outra pessoa, e vou dar ao filme o tempo dele. É ele [o filme] que vai dizer o ritmo dessa montagem”, comenta. Para Lacca, o segundo semestre de 2013 é um período possível para o lançamento de “Permanência”.

domingo, 5 de agosto de 2012

A Aventura Shakespeariana

Esta semana fui assistir "Sua Incelença, Ricardo III" do grupo Clowns de Shakespeare, de Natal. Com direção de Gabriel Villela e seus figurinos impecáveis, excelentes atores e soluções cênicas divertidas e surpreendentes e digo: o brado desta Inglaterra sertaneja vale a pena ser visto e ouvido. É de graça, no SESC Belenzinho, tem um ótimo trabalho musical e convenhamos, trata-se de um texto de Shakespeare.

No teatro, pessoas podem dar bons mestres, máscaras podem ser mestres vitais para um ator, mas alguns textos também o são. Os de Shakespeare com certeza se enquadram nessa categoria. Vale lembrar que "o Bardo", além de dramaturgo e diretor, era chefe de Companhia e, com seus espetáculos, tinha por obrigação alimentar seus atores; e a concorrência, na época não era fraca. Quer motivação melhor do que a fome? Além disso, tudo que era escrito era encenado, dito, testado, e Shakespeare podia reescrever falas ou passagens de acordo com a reação do público. Esse textos chegam a nós mais do que burilados e milhares de vezes confrontados com os espectadores. Não resta dúvidas: são bons.

Tão bons que um dos meus mestres, Maurice Durozier, do Théâtre du Soleil, me chamou, no ano passado, para ir com ele à Natal trabalhar um pouco de tragédia shakespeariana, a título pedagógico, justamente com meus amigos dos Clowns de Shakespeare, no Rio Grande no Norte. Juntos, partimos em uma aventura incrível: labutar, durante uma semana, sobre o texto Ricardo II, a partir da montagem deste feita pelo Théâtre du Soleil na década de 80. Ou seja, mergulhar na guerra de sucessão do trono da Inglaterra Medieval inspirados do Teatro Nô, Japonês. (Realmente Ariane Mnoushkine têm umas idéias supreendentes!).

Compramos quimonos, tecidos, meias para os cabelos, faixas e atacamos, diretamente, o palco. Com o texto numa das mãos e as rédeas de cavalos imaginários na outra, nós lançamos. É incrível entender o significado de uma frase no momento em que se é confrontado a ela. No mesmo momento em que se é tomado pela emoção da cena.  Durante uma semana fomos reis, rainhas, criados, marechais, guerreiros, covardes, leais, cavaleiros, conspiradores, assassinos... Durante uma semana cavalgamos por prados infindáveis, escalamos torres, amaldiçoamos, fomos amaldiçoados, sofremos e amamos. Tudo sob a condução apaixonada de Maurice e as boas estrelas de Shakespeare, do Soleil, e do caminho luminoso dos Clowns.