Vim para Salvador
assistir a estréia do novo espetáculo do
Bando de Teatro Olodum. Trata-se de DÔ, uma criação dirigida pelo célebre
dançarino de Butô Tadashi Endo. A montagem, feita em tempo recorde, reflete a
força desse encontro inusitado e feliz:
a energia e carisma dos atores negros do
Bando e a melancolia e profundidade do universo do Butô. "Dô" é uma palavra
japonesa que significa "movimento", mas o título, no Brasil, e mais
especificamente na Bahia, ganhou outros significados: “dô” de “dor”, “dô” de “dou.”
Quando vi a peça pela
primeira vez fiquei imersa em suas
imagens, o universo ora terrestre, ora lunar, construído por Tadashi, a
beleza dos corpos dos atores. Só depois o espetáculo foi ganhando para mim ares mais narrativos. Uma história de
exilados, retirantes, refugiados, que, através da força e de sua história
pessoal, tentam impor sua individualidade no ambiente hostil que passam a
ocupar.
As metáforas da catástrofe, tão comuns ao Butô, tem aqui,
apesar de tudo, cores vivas e formas alegres. O espaço arrasado é uma pscina de
bolas onde, pouco a pouco, os indivíduos redescobrem o prazer e, através de uma
nova pele, reencontram uma forma de harmonia coletiva. Passado o estupor da
trégua, a realidade recai sobre os corpos que se esforçam para se reconstruír.
Pouco a pouco, os movimentos se tornam mais fluídos e humanos e, apesar das
sequelas, as pessoas ali reunidas acabam por se reconciliar com o espaço urbano
através de uma apropriarção da cidade por via de seus corpos e do espaço que
eles ocupam: tanto físico quanto simbólico.
Por beber do Butô a peça, impreterivelmente, nos faz pensar
na segunda guerra mundial e na bomba atônica, mas nos remete, mais
recentemente, ao terremoto, ao tsumani e a catástrofe nuclear que abalou o
Japão em 2011. Simultaneamente é capaz de nos trazer à realidade das cidades
brasileiras e seu frágil equilíbrio social. Belo.
O Bando de Teatro Olodum conta com 20 anos de atuação e faz parte da história do teatro baiano. A companhia, residente do Teatro Vila Velha, é formada por atores exclusivamente negros, é uma das poucas a manter um corpo estável, com elenco, diretores e técnicos. Em sua trajetória, o Bando construiu e consolidou uma dramaturgia e estética próprias, tendo o negro e sua tradição sociocultural como matéria-prima de seus espetáculos.
Tadashi
Endo
é diretor do Mamu Butoh Center e do Mamu Butoh-Festivais em Göttingen
(Alemanha). É, atualmente, o principal divugador de Butô no Ocidente. Foi
discípulo do mestre Kazuo Ohno. O butô é uma forma de dança-teatro que
surgiu no Japão pós-guerra. Criada por Tatsumi Hijikata e Kasuo Ohno, que
ganhou o mundo a partir da década de 1970.
Belo post.
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